quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Camaleão na sombra da noite II


De um pequeno e raro livro, seguem algumas traduções de Alexandre Vargas, de Portugal, dos poemas de Peter Hammil e também dos Van der Graaf Generator, que serão aqui postados de tempos em tempos.

Uma Praga de Faroleiros

1) Testemunha ocular

Ainda á espera do meu salvador, tempestades me desfazem membro a membro, os dedos parecem-me algas, estou tão longe estou demasiado dentro. Eu sou um homem só, a minha solidão é real, os meus olhos nasceram testemunhas desoladas e agora os meus cavalos também estão contados: vi as linhas das mãos dos mortos, as estrelas brilham mas não para mim. Profetizo catástrofes e então considero o preço, brilho, mas a brilhar a morrer, sei que estou quase perdido. Papel branco jaz na mesa e a minha torre é de pedra, apenas tenho tesouras rombas, apenas tenho o lar mais pobre. Eu fui testemunha e o selo da morte detém-se na onda derretida que é a minha cabeça. Quando vires os esqueletos dos mastros dos veleiros a afundar, começarás a pensar se os temas de todos os mitos antigos não serão solenemente dirigidos direitinhos a ti.

2) Imagens / Farol

3) Testemunha Ocular

Há mito que passaram todas as oportunidades de nos arrependermos. As paredes são finas como pano e, se eu falar, quebrarei os vidros. Por isso, apenas penso em como poderia isso ter sido, fechado num monólogo silencioso, num calado grito. Estou demasiado cansado para falar e enquanto as ondas rebentam no ermo começo a misturar pedras da torre e chego à conclusão de que fui vencido.

4) S. H. M.

“Irreal, irreal” gritam fantasmas com elmos e caem pelo céu afora. Não atravessam os meus guinchos de gaivota, nenhuma pausa até que eu morra. Os espectros arranham nas janelas esvaziadas faces, sorrisos esquecidos, apenas tentando destruir o que perderam. Rastejo parede acima até que acabe o grau de inclinação em queda vertical. O meu balde pôs-se ao largo no mar, nada de esperanças ridículas na madrugada! Brilha o branco osso na máscara de goelas de ferro. Gajeiros perdidos, perfuram a escuridão paralisante, paralelos à minha isolada torre, sem parafina para flama, sem porto a alcançar.

5) Presença da Noite

“Solitário, solitário”, chamam todos os fantasmas, alvejam-me na luz, a única vida que sinto é a presença da noite. Chorarias se eu morresse? Compreenderias a minha última palavra? Perceberias as minhas palavras? Sei que não há tempo, sei que isso não significa nada, falsos sinais me encontram. Não quero odiar. Apenas quero crescer, por que razão não consigo deixar-me viver e ser livre – antes me deixo lentamente morrer? De mais caminhos não sei, tenho tanto medo, não me deixo ser apenas eu mesmo e assim estou completamente só.

6) Excursão Kosmos

O maelstrom da minha memória é um vampiro e de mim se alimenta assim, escrevinhando loucamente sobre o clarão, caio.

7) O Último Quiosque (de creme de leite e ovos)

Podem os faróis iluminar a chave, mas conseguirei eu encontrar a porta? Quero andar por sobre o mar para que mais depressa atinja a costa, como poderei então eu alguma vez manter os pés secos? Perscruto o horizonte, devo vigiar tudo o que me constitui. Olhando para trás no tempo sei que perdi o rumo; corri para o abrigo como um cão; sou agora o estranho que sou... Ah, bem. Toda aflição que eu conheci me deixa à procura de uma paz solitária, mas tenho experiência na cabeça, estou demasiado perto da luz, não creio que veja bem, pois me cego a mim mesmo...

8) O Coágulo Engrossa (as coisas complicam-se)

Onde está o deus que guia a minha mão? Como poderão alcançar-me as mãos dos outros? Quando encontrarei aquilo que procuro? Quem é que me vai ensinar? Eu sou eu. Sou nós. Não conseguimos ver nenhuma saída para isto. Mar que rebenta história atrofiada: a sorte perdeu a minha Guinevere. Não quero se uma onda na água, mas o mar me arrastará para o fundo. Mais um afogado perdido. Vejo os Lémingues a chegar, mas sei que sou apenas um homem. Juntar-me-ei a eles ou naufragarei? Qual é a melhor das hipóteses?

9) O Fim da Terra (sinal da linha)

Oceanos a fluir de todos os lados e sou atraído pelas palavras mágicas: sinto-vos à minha volta – conheço agora o poço. Estrelas retalham horizontes onde os tempos demasiado desolados se mantém. Sinto que me afogo – mãos estendem-se na escuridão. Acampamentos de panóplia e majestade, o que é a liberdade de escolher? Em que posição fico eu no desfile, que voz é a minha? Agora já não parece custar tanto – penso que o fim é o princípio... Todas as coisas são uma parte do todo. Todas as coisas estão longe de tudo. Todas as coisas são uma parte do todo.

10) Agora Partimos


Peter Hammill, de “Pawn Hearts”

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